quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Numero 256




Hoje, um feriado nublado em Belo Horizonte, fazemos um boletim com algumas matérias que dão continuidade a assuntos abordados no número anterior.
O que está acontecendo no Rio ainda é motivo para muitos comentários e artigos. Recebi algumas colaborações que julguei pertinente transcrever aqui.
Além disso, temos ainda a repercussão dos documentos “secretos” que mais de 2 milhões de cidadãos norte-americanos podiam acessar e, claro, sempre algum deles poderia “vazar”. O que me espanta nessa questão toda é que dois temas muito caros à nossa imprensa – democracia e liberdade de expressão – não aparecem em momento algum.
Ora se vê pessoas tentando desacreditar a importância dos documentos, ora se vê gente dizendo que não passa de fofocas. Mas ninguém comenta o fato de que numa Democracia, se é o povo que está no poder por meio de seus representantes, esse mesmo povo ignora o que os ditos representantes estão a fazer mundo afora. E a prisão eminentemente política do criador do site Wikileaks não é apontada por nenhum jornal como cerceamento da liberdade de expressão.
Muito estranho esse jornalismo tupiniquim.



Colaboração de Ana Cláudia:


Reality show em tempo real

É moralmente inadmissível essa assimilação de uma tragédia urbana, com mortes e sofrimento, a um show de TV. Nem faz justiça ao comportamento da polícia: o Bope sentiu-se prejudicado, em plena ação, pela cobertura televisiva; o secretário de Segurança enfatizou que "não há nada a celebrar". O comedimento da polícia é uma crítica implícita à falta de consciência crítica dos jornalistas.
"A fascinante violência no Rio de Janeiro foi de novo um sucesso."

A frase final de um artigo do editor de Destak (sexta-feira, 26/11), jornal carioca de distribuição gratuita nos sinais de trânsito, vale como sintoma do que foi a cobertura jornalística (imprensa escrita e televisão) do terrorismo delinquente nas ruas do Rio e da consequente reação das forças policiais. Em termos de modelagem ideológico-editorial, não há diferença entre a pequena e a grande imprensa.

Como preliminar, é preciso deixar claro que a operação policial, com o apoio logístico da Marinha e reforço posterior do Exército e da Polícia Federal, foi recebida com aplausos pela população, inclusive a maior parte dos moradores do complexo de favelas invadido, todos já psicologicamente saturados dos efeitos desgastantes do domínio dos bandos ilegalistas sobre os cidadãos de todas as classes sociais. Na sociedade e na web: uma ligeira vista de olhos pelas redes sociais permite localizar endereços de Facebook com caveiras (emblema do Bope) estampadas.

Por outro lado, se nas ruas do "asfalto" o medo ronda pedestres e motoristas, nos morros, ou "comunidades periféricas", registra-se o imenso alívio de moradores que, além do cerceamento do direito constitucional de ir e vir, eram ultimamente obrigados a servir comida a marginais desfalcados da renda costumeira do tráfico de drogas, em virtude da ação das "unidades pacificadoras".

Jornalismo "técnico"

Mas não há nada de "fascinante" nisso tudo, nem mesmo a ser "celebrado", como frisou o secretário de Segurança Pública do Rio, José Mariano Beltrame. A hora é de preocupação ou de pausa para a reflexão, bem ao contrário da espetacularização encenada pela mídia. Na verdade, é mesmo ocasião para alguma tristeza em face do número elevado de mortos e da convicção de que a situação a que agora se chegou é o resultado de desgovernos anteriores e da crescente mafialização da vida pública. Este fenômeno abrange a composição de partes significativas de câmaras legislativas, a corrupção policial, a fragilidade do Poder Judiciário, a disseminação das milícias (potencialmente mais perigosas do que o narcotráfico) e a escandalosa indiferença da própria sociedade ao consumo de drogas.

A mídia é aqui também objeto de preocupação.

É verdade que foi provavelmente uma imagem veiculada pela TV Globo (dezenas de bandidos armados e reunidos na Vila Cruzeiro, o bunker das ações terroristas nas ruas) a deflagradora da invasão e ocupação do local por tropas de elite da polícia, escudadas por veículos blindados da Marinha. Imagens de TV – mas também o risco de arranhão na imagem internacional da cidade que abrigará a Copa e as Olimpíadas – são claramente motivadoras da ação. Afinal, o poder constituído sabia desde muito tempo atrás do incremento exponencial de sua contrapartida nas favelas, o poder do ilegalismo.

Mas a cobertura jornalística dos acontecimentos, a televisiva principalmente, revelou o anacronismo cívico de um jornalismo puramente "técnico", movido pelo espetáculo do fato e praticado nos moldes de uma presumida filmagem, ao vivo, da realidade. "Globocop", nome do helicóptero da TV Globo, é a máquina equipada com quatro tripulantes e uma câmera capaz de girar em 360 graus e de captar imagens com precisão a um quilômetro de distância.

"Como Copa do Mundo"

Evocativa de Robocop, conhecido personagem cinematográfico, a máquina televisiva associou-se à metáfora da "máquina de guerra", usada pela mídia para caracterizar as ações policiais. Com ela, a cobertura converteu-se numa espécie de "Tropa de Elite 3", produzindo efeitos de identificação projetiva, segundo os quais estariam entrando em ação aqueles que o colunista Merval Pereira designou como "centenas de capitães Nascimento encarnados em cada um dos soldados do Bope" (O Globo, 26/11/2010).

Como num filme ou numa telenovela, constrói-se uma polaridade (os bons contra os maus), da qual se alimenta a narrativa midiática. O texto de Destak é explícito: "Éramos nós atirando, acenando com bandeiras brancas sobre lajes e nos escondendo dos tiros dentro de casa, contra eles, que fugiam ou nos afrontavam. (...) A cidade se uniu diante da TV, tentando torcer por si". Essa polaridade ("nós" contra "eles") é tão falsa quanto a polaridade entre polícia e bandido, já que, na corrupção cotidiana, não raro um termo equivale ao outro.

Mas a lógica do espetáculo demanda uma oposição folhetinesca. Assim, as palavras em itálico (cena, torcida) são índices semióticos da espetacularização, confirmada na coluna de Merval Pereira: a cobertura seria de fato "um reality show em tempo real". Seria algo como um game, encenação televisiva de um "show da vida" ou uma partida de futebol, capaz de converter o cidadão em torcedor: "Uma sensação parecida com ver um jogo de Copa do Mundo. Em vez de um time representando o país, eram policiais. Em vez de gol, a vibração surgiu no momento em que dois traficantes em fuga a pé foram alvejados" (Destak).

Razões da impunidade

Há algo de socialmente obsceno nesse transbordamento do espetáculo. É moralmente inadmissível essa assimilação de uma tragédia urbana, com mortes e sofrimento, a um show de TV. Nem faz justiça ao comportamento da polícia: o Bope sentiu-se prejudicado, em plena ação, pela cobertura televisiva; o secretário de Segurança enfatizou que "não há nada a celebrar". O comedimento da polícia é uma crítica implícita à falta de consciência crítica dos jornalistas.

Como poderia manifestar-se essa consciência?

Antes de tudo, no questionamento desse modelo de jornalismo, que confunde a informação responsável do fato com a exposição obscena (em seu sentido radical, esta palavra de origem latina significa postar-se diante da cena – ob-scenum – sem as devidas mediações culturais) dos acontecimentos. Simplesmente mostrar não é informar. Pode ser, no limite, um modo de excitar a pulsão escopofílica do espectador.

Informar criticamente – o que se revela socialmente imprescindível no caso em pauta – seria comunicar os acontecimentos dentro do quadro explicativo de suas causas, aliás bastante evidentes para qualquer observador atento. Pode-se começar com os constituintes de 1988, que legislaram em matéria penal com a ditadura e o preso político em mente e, ao fundo, a doutrina liberal-individualista do direito pós-Revolução Francesa. Resultou daí uma legislação tíbia frente ao delinquente comum, com a impunidade no horizonte. Mata-se por dá cá essa palha.

Comedimento e responsabilidade

Em seguida, seria preciso colocar em pauta a corrupção avassaladora de governos, políticos, policiais etc. Não deixar também de indagar sobre a responsabilidade da sociedade civil (se é que esse conceito se aplica ao Brasil) no tocante às drogas e à mafialização generalizada, que vem pondo em segundo plano o problema do tráfico de drogas. Finalmente, tentar jogar alguma luz sobre as perspectivas de emprego para quem se dispõe a abandonar o crime.

Certo, o jornalista poderá responder a tudo isso com a alegação de que o imediato de sua condição profissional lança-o sob pressão sobre a superfície do fato, para dar conta a seu público das ocorrências em bruto. A notícia seria, assim, a pura e simples mercadoria de sua prática industrial. É o que se aprende, é o que se faz – e o que dá certo em termos de audiência e mercado publicitário.

Esse é, de fato, o modelo consagrado pelo jornalismo tal como o conhecemos e talvez não possa ser mudado sem mais nem menos. Mas é certamente um modelo sem amanhã cívico; portanto, algo a ser debatido e repensado.

Nesse meio tempo, seria oportuno um pouco mais de comedimento e responsabilidade social. A morte violenta do outro não pode converter-se em fantástico show da vida.
Publicado por Observatório da Imprensa.

Colaboração de Vânia Facury:

Eu ajudei a destruir o Rio!

Fonte: Jornal de Brasília

Sylvio Guedes, editor-chefe do Jornal de Brasília, critica o "cinismo" ...dos jornalistas, artistas e intelectuais ao defenderem o fim do poder paralelo dos chefes do tráfico de drogas. Guedes desafia a todos que "tanto se drogaram nas últimas décadas que venham a público assumir: eu ajudei a destruir o Rio de Janeiro".

Leia o artigo na íntegra:

É irônico que a classe artística e a categoria dos jornalistas estejam agora na, por assim dizer, vanguarda da atual campanha contra a violência enfrentada pelo Rio de Janeiro. Essa postura é produto do absoluto cinismo de muitas das pessoas e instituições que vemos participando de atos, fazendo declarações e defendendo o fim do poder paralelo dos chefões do tráfico de drogas.

Quando a cocaína começou a se infiltrar de fato no Rio de Janeiro, lá pelo fim da década de 70, entrou pela porta da frente. Pela classe média, pelas festinhas de embalo da Zona Sul, pelas danceterias, pelos barzinhos de Ipanema e Leblon. Invadiu e se instalou nas redações de jornais e nas emissoras de TV, sob o silêncio comprometedor de suas chefias e diretorias.

Quanto mais glamuroso o ambiente, quanto mais supostamente intelectualizado o grupo, mais você podia encontrar gente cheirando carreiras e carreiras do pó branco. Em uma espúria relação de cumplicidade, imprensa e classe artística (que tanto se orgulham de serem, ambas, formadoras de opinião) de fato contribuíram enormemente para que o consumo das drogas, em especial da cocaína, se disseminasse no seio da sociedade carioca - e brasileira, por extensão. Achavam o máximo; era, como se costumava dizer, um barato.

Festa sem cocaína era festa careta. As pessoas curtiam a comodidade proporcionada pelos fornecedores: entregavam a droga em casa, sem a necessidade de inconvenientes viagens ao decaído mundo dos morros, vizinhos aos edifícios ricos do asfalto.

Nem é preciso detalhar como essa simples relação econômica de mercado terminou. Onde há demanda, deve haver a necessária oferta. E assim, com tanta gente endinheirada disposta a cheirar ou injetar sua dose diária de cocaína, os pés-de-chinelo das favelas viraram barões das drogas.

Há farta literatura mostrando como as conexões dos meliantes rastacuera, que só fumavam um baseado aqui e acolá, se tornaram senhores de um império, tomaram de assalto a mais linda cidade do país e agora cortam cabeças de quem ousa lhes cruzar o caminho e as exibem em bandejas, certos da impunidade.

Qualquer mentecapto sabe que não pode persistir um sistema jurídico em que é proibida e reprimida a produção e venda da droga, porém seu consumo é, digamos assim, tolerado. São doentes os que consomem. Não sabem o que fazem. Não têm controle sobre seus atos. Destroem famílias, arrasam lares, destroçam futuros.

Que a mídia, os artistas e os intelectuais que tanto se drogaram nas três últimas décadas venham a público assumir:

"Eu ajudei a destruir o Rio de Janeiro."
Façam um adesivo e preguem no vidro de seus Audis, BMWs e Mercedes.




Jobim: nos tempos de Jango?
Quando disse ao diplomata americano que o ministro Samuel Pinheiro Guimarães “odeia os Estados Unidos e trabalha para criar problemas na relação entre Brasília e Washington", Nelson Jobim se afigurou como triste personagem de uma geopolítica de vice-reinado.
Gilson Caroni Filho (www.cartamaior.com.br)

O professor Boaventura de Souza Santos, da Universidade de Coimbra, escreveu, há 11 anos, que: “uma parte do que de importante ocorre no mundo é em segredo e em silêncio, fora do alcance dos cidadãos. E o dilema para a democracia daqui resultante é que os segredos só podem ser conhecidos a posteriori, depois de deixarem de ser, depois de produzirem fatos consumados que escaparam ao controle democrático". Referia-se ele, na época, ao Acordo Multilateral de Investimentos (AMI), que vinha sendo negociado na surdina, entre os países desenvolvidos da OCDE (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico), por iniciativa dos Estados Unidos e da União Européia, com cinco países observadores, entre eles o Brasil de FHC. Tratava-se de uma carta magna das corporações transnacionais que não deixava aos países da periferia qualquer margem de soberania.

Graças ao vazamento do site Wikileaks, organização que confirma o surgimento de uma nova esfera informativa mundial, os fatos e manobras que permaneciam ocultos, na lúcida observação de Boaventura, se tornaram de conhecimento público, expondo, no caso brasileiro, o tamanho da queda que nos querem impor, ou a que estamos sujeitos.

Os telegramas de Clifford Sobel, ex-embaixador dos EUA no Brasil, dando conta dos serviços prestados pelo ministro da Defesa, Nelson Jobim, a um país estrangeiro são emblemáticos. A presença de Jobim no futuro governo pode ter se tornado inviável. Mais do que nunca é importante lembrar a existência de uma relação íntima entre a intensidade da ameaça e a firmeza da resposta. Não há justificativa plausível, nem mesmo na lógica de uma estreita Realpolitik, para a continuação de Jobim à frente da pasta da Defesa. Um pequeno histórico se faz necessário quando mentalidades mórbidas voltam a atacar a soberania nacional, como se fosse praga e empecilho a ser removido.

Ao se abrirem os anos 1960, a diplomacia brasileira, refletindo tanto as novas realidades internacionais quanto a correlação interna das forças sociopolíticas, desenvolveu os seus primeiros esforços no sentido de divorciar-se do caduco alinhamento incondicional ao imperialismo, herança dos tempos da Guerra Fria. Foram dados, então, os passos do que, à época, ficou conhecido como "política externa independente"

O golpe de 1964 interrompeu esse processo. O regime emergente de 1º de abril, medularmente comprometido com o imperialismo estadunidense, acoplou à repressão no interior ("segurança nacional") o reacionarismo na política externa (fronteiras ideológicas). O posicionamento internacional daí resultante só poderia ter sido aquilo que que sabemos: a subserviência mais lamentável aos desígnios do Império - de que permanece, como triste exemplo, a nossa intervenção na República Dominicana, no bojo da sinistra "Força Interamericana de Paz".

Pouco a pouco, todavia, este posicionamento - lesivo à verdadeira soberania nacional, aviltante para uma república soberana - foi sendo ultrapassado pela realidade da vida. Entre as complicações de um mundo cada vez menos definível segundo o maniqueísmo dos “blocos" e as contradições do desenvolvimento das forças produtivas no país, a concepção das "fronteiras ideológicas" passou, de fato, à categoria de figura de retórica. Especialmente a partir dos primeiros anos da década de 70, os governos militares foram compelidos a descolar-se do jogo internacional do imperialismo.

E sempre que o fizeram, conflitando com sua política interna e com seu próprio discurso global, marcaram posições progressistas que lhes valeram significativos créditos entre a comunidade das nações. Basta pensar na postura brasileira em face da luta de libertação dos povos africanos, diante da Organização para Libertação da Palestina (OLP) e em relação às Malvinas.

A importância deste descolamento, conduzido consequentemente após a redemocratização, configurou o perfil que as forças democráticas reclamam para o Brasil: o de um país independente, com uma posição internacional e soberana e autônoma. Este cenário, evidentemente, é função da situação nacional. Somente um regime democrático, como o que temos hoje, assentado na mais ampla participação popular, pode aprofundar as tendências progressistas de nossa política externa. Vale dizer: a luta pela reorganização democrática da sociedade continua sendo conjugada à luta para sistematizar uma inserção internacional que corresponda aos interesses da maioria do nosso povo.

No limiar do futuro, a sociedade brasileira aparenta ser prisioneira do seu passado que, por ainda não ter sido dominado, ameaça se voltar contra ela. Pois é na hora do vôo livre para uma área ainda por construir, porém promissora, que a vontade não pode se distrair na desconfiança de que, mais uma vez, reiteramos antigos erros.

Quando disse ao diplomata americano que o ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, Samuel Pinheiro Guimarães, “odeia os Estados Unidos e trabalha para criar problemas na relação entre Brasília e Washington", Nelson Jobim se afigurou como triste personagem de uma geopolítica de vice-reinado.

Por aí, estaríamos condenados a viver em um território estranho à dialética, oscilando mecanicamente entre velhas sístoles e diástoles, vítimas de uma conspiração da nossa própria história. Cabe à presidente eleita avaliar se vale a pena apostar no atual ministro da Defesa. Por seu desempenho nos últimos anos e pelas confidências reveladas pelo site, Jobim está empenhado em uma aventura que lhe permita tomar o passado de assalto, obrigando o país a viver uma vida que não é a sua, como se fosse a única possível. Seria Jango o seu alvo?

Gilson Caroni Filho é professor de Sociologia das Faculdades Integradas Hélio Alonso (Facha), no Rio de Janeiro, colunista da Carta Maior e colaborador do Jornal do Brasil


Colaboração de Guilherme Souto:

Fonte: www.brasilianas.org
O golpe de Honduras, segundo o Departamento de Estado
Enviado por luisnassif, sab, 04/12/2010 - 09:36
Por Nilson Fernandes
Telegrama mostra que Brasil estava certo em Honduras, diz Amorim
O chanceler Celso Amorim disse nesta sexta-feira que o telegrama em que o embaixador americano em Honduras, Hugo Llorens, afirma não ter dúvidas de que houve um golpe "ilegal e inconstitucional" no país mostra que o Brasil estava certo no episódio.
"Fomos criticados aqui por muitos e o embaixador americano reconhece que aquilo ali foi um golpe, que contrariava a democracia nas Américas."
O telegrama, vazado pelo site WikiLeaks, foi enviado a Washington em 23 de julho de 2009, quase um mês depois da deposição do presidente Manuel Zelaya.
No texto, Llorens analisa juridicamente o episódio e afirma que a ação dos militares, da Corte Suprema e do Congresso Nacional não teve respaldo na Constituição hondurenha.
O embaixador americano diz que a tese de que Zelaya violara a lei ao organizar um referendo sobre a convocação de uma Assembleia Constituinte "não foi provada" e que a acusação de que ele pretendia prolongar seu mandato é uma "suposição".
Llorens também chama de "ilegítimo" o governo de Roberto Micheletti, que assumiu após a expulsão de Zelaya de Honduras.
Para Amorim, será preciso esperar os vazamentos de documentos "de setembro ou outubro" de 2009 para ver por que os EUA, depois de condenarem o golpe, passaram a apoiar a eleição presidencial realizada sob os golpistas.
"Havia ligações grandes de setores do establishment norte-americano com o hondurenho, isso é público", disse o chanceler.
O governo brasileiro ainda não normalizou as relações com o presidente eleito em novembro de 2009, Porfirio Lobo, e mantém-se contra a revogação da decisão que suspendeu Honduras da OEA (Organização dos Estados Americanos), com base na Carta Democrática da entidade.
Amorim disse que o Brasil ainda espera que Zelaya possa voltar ao país e que o novo governo dê "garantias de direitos humanos, de liberdade de expressão". "Ele [Zelaya] devia ter voltado como presidente nem que fosse para passar o cargo, presidir as eleições. Do contrário seria fácil, você não gosta de uma situação, dá um golpe e depois faz eleição."
NUCLEAR
O ministro também comentou telegramas em que a embaixada americana em Paris relata preocupação do governo francês com a posição de Brasil, Turquia e China em relação ao Irã.
Um desses documentos, de janeiro deste ano, cita um conselheiro do presidente Nicolas Sarkozy segundo o qual o Brasil foi ingênuo ao desconhecer "os limites" da proposta de Obama de iniciar diálogo com Teerã.
"O assessor do presidente [Sarkozy] com quem mantive diálogo direto várias vezes nos estimulou a continuar [buscando acordo sobre a questão nuclear]. Não vou dizer que ele achasse tudo resolvido, nem nós achávamos", disse Amorim.
Para o chanceler, a França tinha interesse em que o Brasil resolvesse o problema da francesa Clotilde Reiss, que foi presa no Irã por dez meses, acusada de espionagem, e libertada por gestão do presidente Lula durante sua visita a Teerã, em maio deste ano.
"Aquilo habilitaria a retomar um diálogo entre a França e o Irã, o que ocorreu. O resto são comentários."
O chanceler brasileiro não criticou os franceses ontem, mas na época Lula ficou irritado porque Sarkozy demorou quase dois meses para telefonar ao iraniano Mahmoud Ahmadinejad e agradecer pela libertação, como havia sido combinado.
No Planalto, hoje existe a certeza de que Sarkozy jogava duplo. Seu interesse na libertação de Reiss estaria ligado às eleições regionais francesas de março deste ano, em que sua coalizão foi derrotada. A soltura ocorreu dois meses depois.
http://www1.folha.uol.com.br/mundo/840591-telegrama-mostra-que-brasil-estava-certo-em-honduras-diz-amorim.shtml





“Italianos eram os nordestinos do início do século XX”
Para historiador, preconceito está ancorado em toda a sociedade brasileira
Eduardo Sales de Lima
Da Redação (www.brasildefato.com.br)


Ficou a dúvida. A atitude da estudante de Direito Mayara Petruso hostilizando os nordestinos por causa do peso dessa região na vitória de Dilma Rousseff nas eleições teria sido algo isolado?

Para responder essa e outras questões que emergiram a partir da atitude da garota, o Brasil de Fato entrevistou, por e-mail, o professor de História da USP, Francisco Alambert. Leia a seguir.

Brasil de Fato - A atitude da estudante de Direito, Mayara Petruso (… afogar os nordestinos), logo após a vitória de Dilma, pode ser vista como algo isolado, ou ela se ancora e se legitima dentro de setores da sociedade paulista?

Francisco Alambert - Está plenamente ancorada na sociedade brasileira (até na nordestina). O melhor termômetro são os blogs de opinião política da direita, inclusive o de grandes veículos, como a Revista Veja. Observe os textos de colunistas como Reinaldo Azevedo (ou de gente como Luis Felipe Pondé, da Folha). Sua linguagem brutalista, estupidificante e raivosa reverbera e se duplica nos “comentários”. Sob um discurso contra a “esquerda” e pela “ética” aparece toda uma desfaçatez e uma violência de classe que não tem vergonha de dizer seu nome. O episódio da demissão de Maria Rita Khel no Estadão, por dizer exatamente que a elite acha que o voto dos pobres deveria valer menos que o seu, é outro exemplo de como isso está ancorado na visão de mundo dos ricos e “inteligentes”.

O professor acredita que essas eleições serviram para desvelar um preconceito já existente latente em setores da sociedade paulista? É possível que tal comportamento se restrinja à "elite"?

Dilma é tão “sulista” quanto Serra. Não foram as eleições que desvelaram o preconceito, mas o “sucesso” (e digo isso sem euforia, porque não sou mais petista, sou um critico à esquerda do PT) do governo Lula e do programa Bolsa Família, que na visão senhorial da elite serviu para diminuir sua margem de lucro com os miseráveis (“eles não querem mais trabalhar pelo salário mínimo para mim, do jeito que eu quero, com quantas horas eu quero”). Mas se fosse só a elite, o PSDB não teria tantos votos quanto teve, nem o Tiririca seria o fenômeno do momento (nordestino ou não). Boa parte dos mais pobres tem horror de se ver no espelho da sua condição de classe.

Quais seriam os elementos históricos-chave que teriam moldado uma suposta visão racista dessa elite regional? A origem do preconceito em relação aos nordestinos seria antes de tudo econômica?

No caso específico de São Paulo, os italianos eram os nordestinos do início do século XX. Quando eles imigraram em massa para o Estado, e especialmente para a cidade, eles ocuparam os setores mais baixos do trabalho. Eram a ralé, e assim eram tratados pelos “quatrocentões” ou por quem se considerava “brasileiro de verdade”, “paulista de quatro costados”, etc. O desenvolvimentismo dos anos 50 a 70 fez com que boa parte desses imigrantes, que chegaram miseráveis e eram objeto de desprezo, ascendessem de classe, fossem para a classe média, por exemplo. A partir desse período começaram a chegar cada vez mais novos imigrantes, só que agora migrantes do Brasil mais pobre, especialmente do nordeste. Eles ocuparam o lugar que um dia foi dos “estrangeiros”, inclusive no que tange ao preconceito de classe. O bizarro é que boa parte dos imigrantes e seus descendentes, ou seja, da nova classe média, se esqueceu de seu passado, e passou a tratar os nordestinos como eles eram tratados (inclusive na sua origem, na Itália, por exemplo): como a escória social. O fato do sobrenome dessa estudante indicar sua ascendência estrangeira é muito sintomático disso.

É possível falar em segregação espacial na cidade de São Paulo?

Em qualquer cidade do mundo capitalista: Los Angeles, Nova York, Paris, Londres (uma segregação que explode sempre em violência). No caso de São Paulo, desde sempre, desde os bairros que um dia segregaram os imigrantes estrangeiros até as periferias de hoje, verdadeiros campos de concentração de miséria e descaso do Estado. E quando esses lugares são ocupados pela violência, pelo tráfico de drogas ou pelo crime organizado, a maioria, os pobres, é que são os “culpados” que devem ser expulsos para que os lugares sejam “revitalizados” (como quer projetos como o da Nova Luz). É sempre o mesmo: culpar as árvores pelo incêndio na floresta.






a Revista Espaço Acadêmico, edição nº 115, dezembro de 2010, foi publicada. Acesse: http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/issue/current

Leia nesta edição o DOSSIÊ ELEIÇÕES 2010 E PERSPECTIVAS POLÍTICAS.




Dossiê comemorativo dos 80 anos da Revolução de 1930


Está disponível no portal CPDOC um dossiê comemorativo dos 80 anos da Revolução de 1930. Faz parte do dossiê uma entrevista inédita com o historiador Boris Fausto, que faz um balanço de seu livro “A Revolução de 1930”, passados 40 anos de sua primeira edição.

Acesse o portal: http://cpdoc.fgv.br

Itinerância da mostra etnográfica no Cineclube FGV

O Cineclube FGV abrigará, em 9 de dezembro, a mostra "Itinerância Universitária", promovida pelo festival "Mostra Internacional do Filme Etnográfico". Será exibido o documentário Avós: Saudades do que não vivi (2009, 78'), de André Paz.

Data: 9 de dezembro (quinta-feira) de 2010
Horário: 17h
Local: Fundação Getulio Vargas
Praia de Botafogo, 190. Auditório 318 (3º andar)




Leia no www.outraspalavras.net:


A Outra Europa que desperta
Mobilizações estudantis na Itália e Inglaterra relembram 1968, combatem cortes de direitos sociais e abalam governos que os adotam. Berlusconi pode cair dia 14. Por Antonio Martins

Os extremos climáticos expostos em Cancún
O que revelam os novos estudos sobre aquecimento global. Por que a conferência da ONU hesita em enfrentar o problema. Por Stephen Leahy, da Agência IPS-Envolverde

Clima: a opção do Orçamento de Carbono
Dois cientistas chineses propõem mecanismo para enfrentar aquecimento global assegurando vida digna para todos e combatendo suntuosidade e desperdício. Por Ricardo Abramovay

Muito longe do equilíbrio
Como nos anos 1970, os EUA respondem à crise com guerra e manipulação do dólar. Mas não se resistirá com propostas ingênuas. Por José Luís Fiori

Uma revolução começou. E será digitalizada
O que ocorrer com o direito à informação definirá a democracia no próximo século. Por isso o Wikileaks é importante. Por Heether Brooke, do The Guardian

A mídia livre depois das eleições
O grande desafio é encontrar fórmulas para remunerar e oferecer vida digna a jornalistas capazes e dispostos a ser independentes. Porque ninguém escapa da ditadura das contas. Por Tadeu Breda, no site Latitude Sul

Educar para um novo poder
Por uma utopia possível: invocar Paulo Freire e Michel Foucault para superar o autoritarismo e o clientelismo que persistem na sociedade brasileira. Por Marilza de Melo Foucher

O canto dos escravos
Nesses tempos de guerra e cantoria, mudou a racionalidade, mudaram as ações e legitimidades. Bíblia muda pra lei, chicote muda pra algemas. Mas a África continua a encher nossas almas. Por Hugo Fanton, no site Latitude Sul

A Falha e a Folha de São Paulo
Numa entrevista em vídeo, os criadores do site que o jornal da família Frias conseguiu censurar questionam: quem tem moral para falar em "liberdade de expressão"?

Enquete: o combate ao crime organizado
Que priorizar: ações como as do Morro do Alemão? Programas de distribuição de renda? Ambos, de modo coordenado? A legalização das drogas? Responda e opine

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