Tenho uma ex-aluna, Aline Antunes, que foi para o Japão e lá constituiu família. Mantenho contato com ela por email, ela sempre tem coisas interessantes para contar. Já me enviou algumas fotos belíssimas de lá, como essas duas aqui.
Claro que a preocupação com ela foi grande, tão logo surgiram as primeiras notícias do terremoto e do tsunami. Felizmente ela está bem, como demonstrado no email que ela enviou para mim, para a família e amigos do Brasil. Nota-se ainda a preocupação com novos tremores, com a radiação, mas... felizmente parece estar tudo bem.
Quando a gente pensa que já nos acostumamos com "as coisas", leia-se, com a tragédia.. deparamo-nos com mais expectativas...
Sobre o vazamento radioativo a situação esta no seguinte pé: o governo em seu ultimo pronunciamento disse estar com a situação sob controle, mas o que ele ainda não explicou foi porque continua ampliando as medidas de segurança. Toquio esta situada a mais ou menos 200km da usina. No momento não ha nenhum risco de contaminação radioativa por aqui.. (só para esclarecer o material esta vindo pelo ar uma vez que tiveram que abrir os reatores para evitar uma explosão). Mas caso apareçam novos complicadores teremos mais essa para resolver. O governo o tempo todo tem nos orientado através da mídia sobre o que fazer caso confirmem radioatividade no ar.
Quanto aos tremores a situação ainda é de alerta. Agora a noite.. depois das 10:00 da noite, quando já pensávamos em ter uma noite tranquila.. alertas. Dois grandes tremores.. na mesma região.. inclusive em Iwate, onde morei. A TV assim como os celulares, são capazes de nos informar através de sirenes (e mensagens no caso da TV) alguns segundos antes do tremor. Parece bobagem mas o negocio ajuda pra caramba. Noite passada por exemplo, enquanto dormiamos, o telefone acionou a sirene três vezes...é desesperador mas não tem como ser de outra forma, pois a situação em si.. é desesperadora. Pelo menos dá para dar uma respirada antes do que estar por vir..
Bom, em suma.. diante do que se tornou o Japão desde sexta -feira,, "nada-de-novo-no front".. Os canais, todos eles, estão 24 horas .. 24 horas.. falando sobre o terremoto. Em alguns momentos sinto como se fosse lavagem cerebral mas o problema é que a situação é emergencial, para não dizer desesperadora.. e mais.. desta vez... estou mergulhada nela...
Mais uma vez, peco-lhes que fiquem tranquilos pois se estamos vendo o numero de 1000 /1500 mortos ainda temos que dar graças a Deus e ao povo japonês. Um tremor desta magnitude, na maioria dos paises do mundo, nos daria uma realidade não muito diferente daquela que nos "petrificou" com o tsunami da Indonesia em Dezembro de 2004. Se temos estes numero é pela força de vontade, profissionalismo e seriedade que esse povo daqui carrega consigo. E que aprendamos mais essa com eles...
Amanha, pela manha, mandarei mais noticias... Agora vou (tentar) dormir..
Fiquem com Deus.. e continuem rezando... pois tenho certeza que nossos corações estão batendo num mesmo ritmo.
Amo vocês por demais.
Obrigada pelo carinho, atenção e preocupação.
Com todo o meu amor
Aline
Claro que a preocupação com ela foi grande, tão logo surgiram as primeiras notícias do terremoto e do tsunami. Felizmente ela está bem, como demonstrado no email que ela enviou para mim, para a família e amigos do Brasil. Nota-se ainda a preocupação com novos tremores, com a radiação, mas... felizmente parece estar tudo bem.
Quando a gente pensa que já nos acostumamos com "as coisas", leia-se, com a tragédia.. deparamo-nos com mais expectativas...
Sobre o vazamento radioativo a situação esta no seguinte pé: o governo em seu ultimo pronunciamento disse estar com a situação sob controle, mas o que ele ainda não explicou foi porque continua ampliando as medidas de segurança. Toquio esta situada a mais ou menos 200km da usina. No momento não ha nenhum risco de contaminação radioativa por aqui.. (só para esclarecer o material esta vindo pelo ar uma vez que tiveram que abrir os reatores para evitar uma explosão). Mas caso apareçam novos complicadores teremos mais essa para resolver. O governo o tempo todo tem nos orientado através da mídia sobre o que fazer caso confirmem radioatividade no ar.
Quanto aos tremores a situação ainda é de alerta. Agora a noite.. depois das 10:00 da noite, quando já pensávamos em ter uma noite tranquila.. alertas. Dois grandes tremores.. na mesma região.. inclusive em Iwate, onde morei. A TV assim como os celulares, são capazes de nos informar através de sirenes (e mensagens no caso da TV) alguns segundos antes do tremor. Parece bobagem mas o negocio ajuda pra caramba. Noite passada por exemplo, enquanto dormiamos, o telefone acionou a sirene três vezes...é desesperador mas não tem como ser de outra forma, pois a situação em si.. é desesperadora. Pelo menos dá para dar uma respirada antes do que estar por vir..
Bom, em suma.. diante do que se tornou o Japão desde sexta -feira,, "nada-de-novo-no front".. Os canais, todos eles, estão 24 horas .. 24 horas.. falando sobre o terremoto. Em alguns momentos sinto como se fosse lavagem cerebral mas o problema é que a situação é emergencial, para não dizer desesperadora.. e mais.. desta vez... estou mergulhada nela...
Mais uma vez, peco-lhes que fiquem tranquilos pois se estamos vendo o numero de 1000 /1500 mortos ainda temos que dar graças a Deus e ao povo japonês. Um tremor desta magnitude, na maioria dos paises do mundo, nos daria uma realidade não muito diferente daquela que nos "petrificou" com o tsunami da Indonesia em Dezembro de 2004. Se temos estes numero é pela força de vontade, profissionalismo e seriedade que esse povo daqui carrega consigo. E que aprendamos mais essa com eles...
Amanha, pela manha, mandarei mais noticias... Agora vou (tentar) dormir..
Fiquem com Deus.. e continuem rezando... pois tenho certeza que nossos corações estão batendo num mesmo ritmo.
Amo vocês por demais.
Obrigada pelo carinho, atenção e preocupação.
Com todo o meu amor
Aline
As mulheres não são homens
A cultura patriarcal tem uma dimensão particularmente perversa: a de criar a ideia na opinião pública que as mulheres são oprimidas e, como tal, vítimas indefesas e silenciosas. Este estereótipo torna possível ignorar ou desvalorizar as lutas de resistência e a capacidade de inovação política das mulheres.
Boaventura de Sousa Santos (WWW.cartamaior.com.br)
No passado dia 8 de março celebrou-se o Dia Internacional da Mulher. Os dias ou anos internacionais não são, em geral, celebrações.
São, pelo contrário, modos de assinalar que há pouco para celebrar e muito para denunciar e transformar. Não há natureza humana assexuada; há homens e mulheres. Falar de natureza humana sem falar na diferença sexual é ocultar que a “metade” das mulheres vale menos que a dos homens. Sob formas que variam consoante o tempo e o lugar, as mulheres têm sido consideradas como seres cuja humanidade é problemática (mais perigosa ou menos capaz) quando comparada com a dos homens. À dominação sexual que este preconceito gera chamamos patriarcado e ao senso comum que o alimenta e reproduz, cultura
patriarcal.
A persistência histórica desta cultura é tão forte que mesmo nas regiões do mundo em que ela foi oficialmente superada pela consagração constitucional da igualdade sexual, as práticas quotidianas das instituições e das relações sociais continuam a reproduzir o
preconceito e a desigualdade. Ser feminista hoje significa reconhecer que tal discriminação existe e é injusta e desejar activamente que ela seja eliminada. Nas actuais condições históricas, falar de natureza humana como se ela fosse sexualmente indiferente, seja no plano filosófico seja no plano político, é pactuar com o patriarcado.
A cultura patriarcal vem de longe e atravessa tanto a cultura ocidental como as culturas africanas, indígenas e islâmicas. Para Aristóteles, a mulher é um homem mutilado e para São Tomás de Aquino, sendo o homem o elemento activo da procriação, o nascimento de uma
mulher é sinal da debilidade do procriador. Esta cultura, ancorada por vezes em textos sagrados (Bíblia e Corão), tem estado sempre ao serviço da economia política dominante que, nos tempos modernos, tem sido o capitalismo e o colonialismo. Em Three Guineas (1938), em resposta a um pedido de apoio financeiro para o esforço de guerra, Virginia Woolf recusa, lembrando a secundarização das mulheres na nação, e afirma
provocatoriamente: “Como mulher, não tenho país. Como mulher, não quero ter país. Como mulher, o meu país é o mundo inteiro”.
Durante a ditadura portuguesa, as Novas Cartas Portuguesas publicadas em 1972 por Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, denunciavam o patriarcado como parte da estrutura fascista que sustentava a guerra colonial em África. "Angola é nossa" era o correlato de "as mulheres são nossas (de nós, homens)" e no sexo delas se defendia a
honra deles. O livro foi imediatamente apreendido porque justamente percebido como um libelo contra a guerra colonial e as autoras só não foram julgadas porque entretanto ocorreu a Revolução dos Cravos em 25 de Abril de 1974.
A violência que a opressão sexual implica ocorre sob duas formas, hardcore e softcore. A versão hardcore é o catálogo da vergonha e do horror do mundo. Em Portugal, morreram 43 mulheres em 2010, vítimas de violência doméstica. Na Cidade Juarez (México) foram assassinadas nos últimos anos 427 mulheres, todas jovens e pobres, trabalhadoras nas
fábricas do capitalismo selvagem, as maquiladoras, um crime organizado hoje conhecido por femicídio. Em vários países de África, continua a praticar-se a mutilação genital. Na Arábia Saudita, até há pouco, as mulheres nem sequer tinham certificado de nascimento. No Irão, a vida de uma mulher vale metade da do homem num acidente de viação; em tribunal, o testemunho de um homem vale tanto quanto o de duas mulheres; a mulher pode ser apedrejada até à morte em caso de adultério, prática, aliás, proibida na maioria dos países de cultura islâmica.
A versão softcore é insidiosa e silenciosa e ocorre no seio das famílias, instituições e comunidades, não porque as mulheres sejam inferiores mas, pelo contrário, porque são consideradas superiores no seu espírito de abnegação e na sua disponibilidade para ajudar em tempos difíceis.
Porque é uma disposição natural. Não há sequer que lhes perguntar se aceitam os encargos ou sob que condições. Em Portugal, por exemplo, os cortes nas despesas sociais do Estado actualmente em curso vitimizam em particular as mulheres. As mulheres são as principais provedoras do cuidado a dependentes (crianças, velhos, doentes, pessoas com
deficiência). Se, com o encerramento dos hospitais psiquiátricos, os doentes mentais são devolvidos às famílias, o cuidado fica a cargo das mulheres. A impossibilidade de conciliar o trabalho remunerado com o trabalho doméstico faz com que Portugal tenha um dos valores mais baixos de fecundidade do mundo. Cuidar dos vivos torna-se incompatível com desejar mais vivos.
Mas a cultura patriarcal tem, em certos contextos, uma outra dimensão particularmente perversa: a de criar a ideia na opinião pública que as mulheres são oprimidas e, como tal, vítimas indefesas e silenciosas.
Este estereótipo torna possível ignorar ou desvalorizar as lutas de resistência e a capacidade de inovação política das mulheres. É assim que se ignora o papel fundamental das mulheres na revolução do Egipto ou na luta contra a pilhagem da terra na Índia; a acção política das mulheres que lideram os municípios em tantas pequenas cidades africanas e a sua luta
contra o machismo dos lideres partidários que bloqueiam o acesso das mulheres ao poder político nacional; a luta incessante e cheia de riscos pela punição dos criminosos levada a cabo pelas mães das jovens assassinadas em Cidade Juarez; as conquistas das mulheres indígenas e islâmicas na luta pela igualdade e pelo respeito da diferença, transformando por dentro as culturas a que pertencem; as práticas inovadoras de defesa da agricultura familiar e das sementes tradicionais das mulheres do Quénia e de tantos outros países de África; a resposta das mulheres palestinianas quando perguntadas por auto-convencidas feministas europeias sobre o uso de contraceptivos: “na Palestina, ter filhos é lutar contra a limpeza étnica que Israel impõe ao nosso povo”.
Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal).
São, pelo contrário, modos de assinalar que há pouco para celebrar e muito para denunciar e transformar. Não há natureza humana assexuada; há homens e mulheres. Falar de natureza humana sem falar na diferença sexual é ocultar que a “metade” das mulheres vale menos que a dos homens. Sob formas que variam consoante o tempo e o lugar, as mulheres têm sido consideradas como seres cuja humanidade é problemática (mais perigosa ou menos capaz) quando comparada com a dos homens. À dominação sexual que este preconceito gera chamamos patriarcado e ao senso comum que o alimenta e reproduz, cultura
patriarcal.
A persistência histórica desta cultura é tão forte que mesmo nas regiões do mundo em que ela foi oficialmente superada pela consagração constitucional da igualdade sexual, as práticas quotidianas das instituições e das relações sociais continuam a reproduzir o
preconceito e a desigualdade. Ser feminista hoje significa reconhecer que tal discriminação existe e é injusta e desejar activamente que ela seja eliminada. Nas actuais condições históricas, falar de natureza humana como se ela fosse sexualmente indiferente, seja no plano filosófico seja no plano político, é pactuar com o patriarcado.
A cultura patriarcal vem de longe e atravessa tanto a cultura ocidental como as culturas africanas, indígenas e islâmicas. Para Aristóteles, a mulher é um homem mutilado e para São Tomás de Aquino, sendo o homem o elemento activo da procriação, o nascimento de uma
mulher é sinal da debilidade do procriador. Esta cultura, ancorada por vezes em textos sagrados (Bíblia e Corão), tem estado sempre ao serviço da economia política dominante que, nos tempos modernos, tem sido o capitalismo e o colonialismo. Em Three Guineas (1938), em resposta a um pedido de apoio financeiro para o esforço de guerra, Virginia Woolf recusa, lembrando a secundarização das mulheres na nação, e afirma
provocatoriamente: “Como mulher, não tenho país. Como mulher, não quero ter país. Como mulher, o meu país é o mundo inteiro”.
Durante a ditadura portuguesa, as Novas Cartas Portuguesas publicadas em 1972 por Maria Isabel Barreno, Maria Teresa Horta e Maria Velho da Costa, denunciavam o patriarcado como parte da estrutura fascista que sustentava a guerra colonial em África. "Angola é nossa" era o correlato de "as mulheres são nossas (de nós, homens)" e no sexo delas se defendia a
honra deles. O livro foi imediatamente apreendido porque justamente percebido como um libelo contra a guerra colonial e as autoras só não foram julgadas porque entretanto ocorreu a Revolução dos Cravos em 25 de Abril de 1974.
A violência que a opressão sexual implica ocorre sob duas formas, hardcore e softcore. A versão hardcore é o catálogo da vergonha e do horror do mundo. Em Portugal, morreram 43 mulheres em 2010, vítimas de violência doméstica. Na Cidade Juarez (México) foram assassinadas nos últimos anos 427 mulheres, todas jovens e pobres, trabalhadoras nas
fábricas do capitalismo selvagem, as maquiladoras, um crime organizado hoje conhecido por femicídio. Em vários países de África, continua a praticar-se a mutilação genital. Na Arábia Saudita, até há pouco, as mulheres nem sequer tinham certificado de nascimento. No Irão, a vida de uma mulher vale metade da do homem num acidente de viação; em tribunal, o testemunho de um homem vale tanto quanto o de duas mulheres; a mulher pode ser apedrejada até à morte em caso de adultério, prática, aliás, proibida na maioria dos países de cultura islâmica.
A versão softcore é insidiosa e silenciosa e ocorre no seio das famílias, instituições e comunidades, não porque as mulheres sejam inferiores mas, pelo contrário, porque são consideradas superiores no seu espírito de abnegação e na sua disponibilidade para ajudar em tempos difíceis.
Porque é uma disposição natural. Não há sequer que lhes perguntar se aceitam os encargos ou sob que condições. Em Portugal, por exemplo, os cortes nas despesas sociais do Estado actualmente em curso vitimizam em particular as mulheres. As mulheres são as principais provedoras do cuidado a dependentes (crianças, velhos, doentes, pessoas com
deficiência). Se, com o encerramento dos hospitais psiquiátricos, os doentes mentais são devolvidos às famílias, o cuidado fica a cargo das mulheres. A impossibilidade de conciliar o trabalho remunerado com o trabalho doméstico faz com que Portugal tenha um dos valores mais baixos de fecundidade do mundo. Cuidar dos vivos torna-se incompatível com desejar mais vivos.
Mas a cultura patriarcal tem, em certos contextos, uma outra dimensão particularmente perversa: a de criar a ideia na opinião pública que as mulheres são oprimidas e, como tal, vítimas indefesas e silenciosas.
Este estereótipo torna possível ignorar ou desvalorizar as lutas de resistência e a capacidade de inovação política das mulheres. É assim que se ignora o papel fundamental das mulheres na revolução do Egipto ou na luta contra a pilhagem da terra na Índia; a acção política das mulheres que lideram os municípios em tantas pequenas cidades africanas e a sua luta
contra o machismo dos lideres partidários que bloqueiam o acesso das mulheres ao poder político nacional; a luta incessante e cheia de riscos pela punição dos criminosos levada a cabo pelas mães das jovens assassinadas em Cidade Juarez; as conquistas das mulheres indígenas e islâmicas na luta pela igualdade e pelo respeito da diferença, transformando por dentro as culturas a que pertencem; as práticas inovadoras de defesa da agricultura familiar e das sementes tradicionais das mulheres do Quénia e de tantos outros países de África; a resposta das mulheres palestinianas quando perguntadas por auto-convencidas feministas europeias sobre o uso de contraceptivos: “na Palestina, ter filhos é lutar contra a limpeza étnica que Israel impõe ao nosso povo”.
Boaventura de Sousa Santos é sociólogo e professor catedrático da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (Portugal).
Uma mulher admirável, a Aracy, de Guimarães Rosa. Vivendo na Alemanha, na época do Nazismo, ajudou muitos judeus a fugirem das garras da SS e da Gestapo. Leia sobre ela um artigo lindo de Eliane Brum:
http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI216621-15230,00-DUAS+MULHERES+INDOMAVEIS.html
Enviado por Vania Facury:
O Rio ganhou dois presentes da história
Elio Gaspari, Folha de São Paulo, 9 de março de 2011.
Um grande livro e o cais de desembarque dos escravos ajudarão a cidade a conhecer seu passado
HÁ MUITO TEMPO o Rio de Janeiro não recebia notícias tão boas de seu passado. É provável que uma equipe de arqueólogos do Museu Nacional tenha encontrado nas escavações da zona portuária as lajes de pedra do cais do Valongo. Entre 1758 e 1851, por aquelas pedras passaram pelo menos 600 mil escravos trazidos d'África. Metade deles tinham entre 10 e 19 anos.
Devolvido à superfície, o cais do Valongo trará ao século 21 o maior porto de chegada de escravos do mundo. Se ele foi soterrado e esquecido, isso se deveu à astuta amnésia que expulsa o negro da história do Brasil. A própria construção do cais teve o propósito de tirar do coração da cidade o mercado de escravos.
A região da Gâmboa tornou-se um mercado de gente, mas as melhores descrições do que lá acontecia saíram todas da pena de viajantes estrangeiros. Os negros ficavam expostos no térreo de sobrados da rua do Valongo (atual Camerino). Em 1817, contaram-se 50 salas onde ficavam 2.000 negros (peças, no idioma da época).
Os milhares de africanos que morreram por conta da viagem ou de padecimentos posteriores, foram jogados numa área que se denominou Cemitério dos Pretos Novos.
Ele foi achado em 1996, durante a reforma de uma casa e, desde então, está sob os cuidados de arqueólogos e historiadores. O cemitério foi soterrado por um lixão, verdadeiro monumento à cultura da amnésia. Devem-se à professora americana Mary Karach 32 páginas magistrais sobre o Valongo. Estão no seu livro "A Vida dos Escravos no Rio de Janeiro - 1808-1850".
Com o possível achado do cais, o prefeito Eduardo Paes anunciou que transformará a área num museu a céu aberto. (Cesar Maia prometeu algo parecido com o cemitério, mas deu em pouca coisa.) Felizmente, as obras do porto respeitarão as restrições recomendadas pelos arqueólogos, até porque, se o Cais do Valongo não estiver exatamente onde se acredita, estará por perto.
O segundo presente são os dois volumes de "Geografia Histórica do Rio de Janeiro - 1502-1700", do professor Mauricio de Almeida Abreu. É uma daquelas obras que só aparecem de 20 em 20 anos. (O livro de Karasch, que está na mesma categoria, é de 1987.)
Ele leu tudo e, em diversos pontos controversos, desempatou controvérsias indo às fontes primárias. Erudito, bem escrito, bem exposto, é um prazer para o leitor. Além disso, os dois pesados volumes da obra estão criteriosamente ilustrados. Nele aprende-se, por exemplo, que o primeiro plano urbano da cidade, do tempo de Mem de Sá, foi traçado por um degredado, Nuno Garcia. (Fuçando-se, sabe-se que era um homicida.)
A edição de 3.000 exemplares, copatrocinada pela Prefeitura do Rio, é um luxo, mas o preço ficou salgado (R$ 198). Sua aparência de livro de mesa pode jogá-lo numa armadilha: quem o tem raramente o lê e quem quer lê-lo não tem como comprá-lo. A prefeitura poderia socorrer a patuleia, providenciando uma edição mais barata ou, até mesmo, uma versão eletrônica.
Quem quiser saber mais (e muito) sobre o Valongo e o Cemitério dos Pretos Novos, pode buscar na internet, em PDF:
Valongo: O Mercado de Escravos do Rio de Janeiro, 1758-1831, do professor Cláudio de Paula Honorato.
À flor da terra: O Cemitério dos Pretos Novos do Rio de Janeiro, de Júlio César Medeiros da Silva Pereira.
O Café História inaugura hoje a sua mais nova seção: "Mural do Historiador". Neste seção, vamos publicar promoções, notícias rápidas, informar sobre concursos, editais, novos sites, fontes na internet e outras informações que não podem faltar no mural do historiador.
Na estréia da nova seção, você confere:
- Livros com 20% de desconto para leitores do Café História
- Concurso de Monografias
- Memória da Educação na Internet
Faça uma visita ao Café História e saiba mais sobre cada assunto.
E atenção: também esperamos usar a nova seção para eventual divulgação de blogs de história independetes (que estão fora do CH).Então, se você quiser ver o seu blog mais conhecido, envie o seu link para cafehistoria@gmail.com. O seu blog poderá ser divulgado em breve para mais de 33 mil pessoas! Escolheremos os mais criativos, originais, bem organizados e atualizados. E, claro, o blog deve dedicar-se à conteúdos de história.
Visite Cafe Historia em: http://cafehistoria.ning.com/?xg_source=msg_mes_network
Devolvido à superfície, o cais do Valongo trará ao século 21 o maior porto de chegada de escravos do mundo. Se ele foi soterrado e esquecido, isso se deveu à astuta amnésia que expulsa o negro da história do Brasil. A própria construção do cais teve o propósito de tirar do coração da cidade o mercado de escravos.
A região da Gâmboa tornou-se um mercado de gente, mas as melhores descrições do que lá acontecia saíram todas da pena de viajantes estrangeiros. Os negros ficavam expostos no térreo de sobrados da rua do Valongo (atual Camerino). Em 1817, contaram-se 50 salas onde ficavam 2.000 negros (peças, no idioma da época).
Os milhares de africanos que morreram por conta da viagem ou de padecimentos posteriores, foram jogados numa área que se denominou Cemitério dos Pretos Novos.
Ele foi achado em 1996, durante a reforma de uma casa e, desde então, está sob os cuidados de arqueólogos e historiadores. O cemitério foi soterrado por um lixão, verdadeiro monumento à cultura da amnésia. Devem-se à professora americana Mary Karach 32 páginas magistrais sobre o Valongo. Estão no seu livro "A Vida dos Escravos no Rio de Janeiro - 1808-1850".
Com o possível achado do cais, o prefeito Eduardo Paes anunciou que transformará a área num museu a céu aberto. (Cesar Maia prometeu algo parecido com o cemitério, mas deu em pouca coisa.) Felizmente, as obras do porto respeitarão as restrições recomendadas pelos arqueólogos, até porque, se o Cais do Valongo não estiver exatamente onde se acredita, estará por perto.
O segundo presente são os dois volumes de "Geografia Histórica do Rio de Janeiro - 1502-1700", do professor Mauricio de Almeida Abreu. É uma daquelas obras que só aparecem de 20 em 20 anos. (O livro de Karasch, que está na mesma categoria, é de 1987.)
Ele leu tudo e, em diversos pontos controversos, desempatou controvérsias indo às fontes primárias. Erudito, bem escrito, bem exposto, é um prazer para o leitor. Além disso, os dois pesados volumes da obra estão criteriosamente ilustrados. Nele aprende-se, por exemplo, que o primeiro plano urbano da cidade, do tempo de Mem de Sá, foi traçado por um degredado, Nuno Garcia. (Fuçando-se, sabe-se que era um homicida.)
A edição de 3.000 exemplares, copatrocinada pela Prefeitura do Rio, é um luxo, mas o preço ficou salgado (R$ 198). Sua aparência de livro de mesa pode jogá-lo numa armadilha: quem o tem raramente o lê e quem quer lê-lo não tem como comprá-lo. A prefeitura poderia socorrer a patuleia, providenciando uma edição mais barata ou, até mesmo, uma versão eletrônica.
Quem quiser saber mais (e muito) sobre o Valongo e o Cemitério dos Pretos Novos, pode buscar na internet, em PDF:
Valongo: O Mercado de Escravos do Rio de Janeiro, 1758-1831, do professor Cláudio de Paula Honorato.
À flor da terra: O Cemitério dos Pretos Novos do Rio de Janeiro, de Júlio César Medeiros da Silva Pereira.
O Café História inaugura hoje a sua mais nova seção: "Mural do Historiador". Neste seção, vamos publicar promoções, notícias rápidas, informar sobre concursos, editais, novos sites, fontes na internet e outras informações que não podem faltar no mural do historiador.
Na estréia da nova seção, você confere:
- Livros com 20% de desconto para leitores do Café História
- Concurso de Monografias
- Memória da Educação na Internet
Faça uma visita ao Café História e saiba mais sobre cada assunto.
E atenção: também esperamos usar a nova seção para eventual divulgação de blogs de história independetes (que estão fora do CH).Então, se você quiser ver o seu blog mais conhecido, envie o seu link para cafehistoria@gmail.com. O seu blog poderá ser divulgado em breve para mais de 33 mil pessoas! Escolheremos os mais criativos, originais, bem organizados e atualizados. E, claro, o blog deve dedicar-se à conteúdos de história.
Visite Cafe Historia em: http://cafehistoria.ning.com/?xg_source=msg_mes_network
ESPECIAL: Japão, o risco nuclear e as imagens do desastre
Cortes de energia tentam evitar derretimento dos reatores. Cresce, em todo o mundo, rede de apoio às vítimas. Fotos e novas tecnologias revelam (ver aqui: 1 2) gravidade da destruição.
À sombra da catástrofe nuclear
Blindagem da usina de Fukushima foi rompida: dúvida é a intensidade da radiação que será liberada. Contaminação durará décadas e pode assemelhar-se à de Chernobyl
Acidente japonês é muito pior que se pensou
Governo e mercados começam a admitir dimensões do vazamento -- omitidas até há pouco para preservar interesses de investidores em energia atômica
Brasil: há razão em optar pelo átomo?
Mesa-redonda nesta quarta-feira, na USP, estimulará debate que precisa envolver um ator até agora ausente: a sociedade civil
A Agência Carta Maior está com um especial sobre a Fome e a desordem financeira mundial. São vários artigos, que merecem ser lidos quando você tiver um tempinho...
http://www.cartamaior.com.br/templates/index.cfm?home_id=112&alterarHomeAtual=1
Contos da Resistência 1 – Estudantes e Igreja
O primeiro episódio de Contos da Resistência retrata a atuação de estudantes e da Igreja contra a ditadura militar. Relatos emocionantes de presos políticos e vítimas do regime marcam o documentário.... ASSISTA EM: http://antoniozai.wordpress.com/2011/03/09/contos-da-resistencia-1-estudantes-e-igreja/
O destino das revoltas árabes está no reino do petróleo
Os sauditas acolheram Osama Bin Laden e a Al Qaeda e os Talibã. Já para não dizer que "contribuíram" com a maioria dos comandos suicidas do 11 de Setembro. E agora os sauditas julgam-se os últimos muçulmanos ainda capazes de combater um mundo que se ilumina. Temo que o destino deste movimento festivo na história do Oriente Médio a que temos assistido venha a ser decidido no reino do petróleo, do rei Abdulah (foto), dos lugares sagrados e da corrupção. Estejam alerta. O artigo é de Robert Fisk.
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=17540
Desordem financeira: as vítimas do livre mercado
No programa 60 Minutos, domingo passado, a principal reportagem tratava sobre o massivo aumento do número de estudantes sem vaga nas escolas públicas dos Estados Unidos. Em um dos condados da Flórida, esse número está aumentando de 15 a 30 alunos por dia. Mas em sua maior parte, os principais meios de comunicação mantem-se distantes, o mais longe possível, destas histórias sobre a nova onda de insensibilidade nos Estados Unidos.
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=17537
O LabepeH (Laboratório de Estudos e Pesquisas em Ensino de História - CP/FAE - UFMG) convida você para a sessão inaugural de 2011, "LabepeH promove Diálogos". O projeto "LabepeH promove Diálogos" foi criado em 2005 e tem como papel fundamental efetivar a relação entre pesquisa, ensino e extensão no campo do Ensino de História, articulando a Universidade Federal de Minas Gerais e as escolas da Educação Básica. Atualmente o projeto é coordenado pelos professores Araci Rodrigues Coelho (CP) e Pablo Lima (FaE).
Na sessão do dia 17 de março, quinta-feira, teremos uma mesa redonda sobre "A História Indígena no ensino de História", com a participação de Circe F. Bittencourt (Historiadora, Profa. da PUC São Paulo), Naine Terena de Jesus (Mestre em Artes pela UNB, doutoranda em Educação pela PUC São Paulo).
A sessão LabepeH promove Diálogos ocorrerá no dia 17 de março de 2011, no Auditório Luiz Pompéu da Faculdade de Educação da UFMG, às 19h.
Atenção: Faça sua inscrição nesse email informando seus dados (nome completo, vinculação institucional e email).
O Laboratório de Estudos Africanos (LeÁfrica), inaugurando suas atividades do ano letivo de 2011 no Instituto de História da UFRJ, convida alunos, professores, pesquisadores e público interessado para a palestra da Profa. Dra. Rachel Jean-Baptiste (Universidade de Chicago), intitulada
"Uma certa moralidade: sexualidade, ordem e vida urbana em Libreville colonial no século XX, Gabão".
Rachel Jean-Baptiste é professora assistente de História da África do Departamento de História da universidade de Chicago, especialista em história social, cultural e política da África Central. Sua pesquisa atual tem como foco questões de gênero, sexualidade, vida urbana, colonialismo e legislação no século XX no Gabão. Outros de seus projetos de pesquisa no local incluem ainda como temas casamentos inter-raciais e a mestiçagem, bem como a codificação do direito costumeiro. Maiores informações sobre a Profa. Rachel Jean Baptiste vide site
http://history.uchicago.edu/faculty/jean-baptiste.shtml
Data: 18 de março de 2011, sexta-feira.
Horário: 15h
Local: Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Largo de São Francisco de Paula, n. 1. Centro. Rio de Janeiro. Sala 109 (térreo)
A palestra terá a duração de 50 min e terá tradução alternada realizada pela Profa. Dra. Lise Sedrez
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